18 março 2009

Penúria

A coluna abaixo é de Humberto Peron, que colabora com a Folha. Faz uma análise da situação do Framengo, que vale também para os demais clubes - sobretudo os cariocas, mais afeitos ao trambique.

17/03/2009
- Flamengo em ruínas
"Meeeeengo!". Por vários anos, só a possibilidade de ouvir a torcida do Flamengo entoando seu grito de guerra no Maracanã já colocava medo nos torcedores e jogadores adversários. Com este clima, o rubro-negro parecia que subia ao gramado como se já estivesse em vantagem no marcador. Ganhar do time no grande estádio era uma proeza. Muitas equipes consideravam as vitórias contra o Flamengo no Rio de Janeiro como históricas, ou comemoravam como se fosse a conquista de um título.
Hoje não. Ninguém mais respeita o Flamengo no Maracanã. Times pequenos e sem tradição não sentem o mínimo problema em desafiar o time mais popular do país. Também pudera: o rubro-negro de hoje está muito mais perto de ser um time mediano do nosso futebol do que uma potência.
Atolado em dívidas, o clube é uma equipe sem credibilidade. Faz pouco tempo os jogadores brigavam para atuar com o manto rubro-negro. Hoje, a maioria dos profissionais não demonstra a mínima vontade de ir para Gávea e, quando vão, fazem exigências absurdas, como pagamento antecipado. Os que estão no time estão loucos para deixar a Gávea --é lógico que eles não vão declarar isto.
Até o clube não vê o momento de se livrar de alguns dos seus principais jogadores para conseguir arrumar uns poucos trocados para pagar uma parcela do que deve aos outros atletas e demais funcionários.
Os torcedores do Flamengo precisam cair na real e aceitar de vez que o time, como eu já disse, está longe de ser um timaço, como os dirigentes do clube gostam de apregoar. Não adianta ir protestar contra os atletas, gritar que eles são mercenários e que não jogam com raça. Talvez os jogadores sejam os menos culpados desta situação. Sem receber e tendo que conviver sempre com a promessa dos dirigentes de que o dinheiro vai cair na próxima segunda-feira, fica difícil se concentrar em apenas jogar futebol.
O pior é que a falta de comando se reflete em situações de crise no elenco. As brigas em rachões, declarações polêmicas e contusões misteriosas surgem porque os jogadores não confiam mais nos dirigentes e aproveitam esse vácuo no poder para fazer o que bem entenderem. Como alguém pode levar a sério uma multa nos seus vencimentos se não recebe os salários?
É lógico que o buraco que se encontra o Flamengo já vem de algum tempo. A dívida atual do clube não foi criada nos últimos anos. Ficaríamos dias discutindo quais foram os culpados pela crise --por isso nem vale a pena ficar citando nomes de dirigentes, pois eles vão passar e o clube continua. Mas não posso eximir ninguém de responsabilidade, pois não faltaram dirigentes que assumiram o clube nos últimos anos e não o tiraram do buraco --pelo contrário, afundaram mais o time.
Talvez o grande erro do Flamengo tenha começado em meados da década de 1990, quando o clube praticamente abandonou as categorias de base para começar a investir em contratações milionárias. O time preferiu jogar várias revelações fora para montar o famoso ataque dos sonhos --aquele formado por Edmundo, Romário e Sávio-- e trazer medalhões que pouco acrescentaram, como Vampeta --trocado pelas promessas Adriano e Reinaldo--, Gamarra, Juninho Paulista e Edílson. Ou seja, o Flamengo foi se apequenando, porque deixou de lado uma das suas principais características que era formar seus ídolos em casa.
Não tem jeito. Para sair da crise em que vive, o Flamengo precisa parar com planos faraônicos. O time arrecada muito dinheiro, mas o joga no lixo. Não adianta gastar por conta, esperando que projetos sem consistência tragam retorno, como as campanhas de sócio-torcedor e uma TV --nem de longe, os dirigentes conseguiram arrecadar o que se projetava. Os planos mirabolantes só fizeram o clube dilapidar o seu patrimônio.
No mínimo, o Flamengo vai precisar de três anos para se reconstruir. Isso passa por recuperar a credibilidade pagando salários e fornecedores. É preciso uma reformulação total no departamento de futebol, como no primeiro momento uma redução drástica na folha do pagamento e no número de pessoas que pensam que comando o departamento.
Com certeza, os resultados vão demorar um pouco para aparecer, a torcida vai sofrer, mas com a esperança de que o clube consiga montar um time forte, com jogadores jovens e que tenham identificação. Assim o Flamengo vai voltar a brigar por campeonatos e não ser apenas um participante dos principais campeonatos.
O Flamengo precisa rapidamente dar um passo para trás, pois se continuar da maneira que está, o próximo movimento será a falência do clube.

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